António Guerra Coutinho

António Guerra Coutinho tem 77 anos. Foi Engenheiro Eletrónico. Neste momento encontra-se reformado. Reside na Amadora.


1. Quais são as suas recordações mais marcantes sobre o regime do Estado Novo?
R: Nasci em pleno Estado Novo, sou natural de Aldeia Viçosa, concelho da Guarda. Vou procurar responder a esta pergunta, recordando a minha visão ao tempo, não o que aprendi depois, quando a minha mente se foi abrindo.
Nada se alterava. Os dias iguais uns aos outros. Havia pobres de pedir pelas portas, mesmo na minha aldeia. O Estado era encarado como uma coisa muito séria e atemorizante. O mundo parecia uma coisa confiável.


2. Onde se encontrava no dia 25 de Abril de 1974? Quais são as suas memórias sobre este dia?
R: Na manhã desse dia estava em Aldeia Viçosa para umas curtas férias. A minha mulher estava grávida e ficou em Lisboa. As memórias são muito poucas, todas centradas nas perguntas: O que se passa? Golpe, mas que golpe? Da situação ou da oposição?


3. Que impacto teve esta revolução na sua vida pessoal e/ou familiar?
R: Impacto? Mudou tudo, logo no dia seguinte já comigo em Lisboa. Impressão marcante: todos boas pessoas e amigos uns dos outros. O país subitamente em festa e subitamente politizado, cada um com direito à sua opinião, sem medo. Este ambiente durou pouco tempo. Em maio já os partidos ensaiavam partir o Povo aos bocados e a agarrar cada qual o seu bocado. Outro impacto na minha vida: mais dinheiro, aumentos inesperados, os sindicatos exigindo, os patrões cedendo em tudo.

4. Como avalia o período que se seguiu à Revolução dos Cravos (como descreve a transição política da ditadura para a democracia, quais são as suas memórias sobre este período, foi um período que o marcou em termos pessoais e/ou familiares - justifique)?
R: O pós-25 de Abril ficou marcado de imediato por esta separação de águas: de um lado os comunistas querendo impor o caminho para uma ditadura do proletariado - Cunhal ou alguém por ele - terá declarado que Portugal nunca haveria de ter uma Democracia Constitucional. Do outro lado aqueles que defendiam os objetivos do Programa dos Capitães de Abril, a saber, Liberdade, Democracia e Descolonização e regresso dos militares aos quartéis. A luta agudizou-se e os lados da barricada ficaram definidos: pela ditadura do proletariado, o PCP; pela democracia parlamentar o PS e todo o centro direita, PPD e CDS.


5. Que avaliação faz da democracia na atualidade?
R: A democracia faz o seu caminho, a situação demonstra que as escolhas primordiais se mantêm - rejeição da democracia do proletariado, defesa da democracia parlamentar. Mas o caminho percorrido mostra que o perigo não tem vindo da esquerda mas, comprovadamente, do capital que entretanto procura, infelizmente por via parlamentar, capturar o Estado e toda a atividade governativa.

Entrevista realizada por Ana Matilde Reis
 Coordenação/Tutoria:
Professora Ana Sofia Pinto