ESTADO NOVO

O Estado Novo foi o regime político autoritário, autocrata e corporativista de Estado que vigorou em Portugal durante 41 anos ininterruptos, desde a aprovação da Constituição de 1933 até ao seu derrube pela Revolução de 25 de Abril de 1974.

Marcelo Caetano - Renovação na Continuidade

A concessão de uma autorização para o regresso de Mário Soares (foi preso pela PIDE e deportado, de março a novembro do ano de 1968, para S. Tomé, devido ao facto de ser advogado de cidadãos perseguidos pelo regime ditatorial e ser um ativista e dirigente da oposição ao regime salazarista) e do bispo do Porto, D. António Ferreira Gomes (o seu exílio deveu-se a uma carta que redigiu a Salazar, datada de julho de 1958. Nesta carta, o bispo do Porto mostrava a sua posição condenatória sobre diversos as­petos da vida política, social, cultural e religiosa do país. A sua ousadia valeu-lhe a proibição de entrada em Portugal quan­do regressava de uma viagem a Roma, no mês de abril de 1959), e o consenti­mento para a realização do II Congresso da Oposição Democrática, em Aveiro, são exemplos de medidas liberalizantes que Marcelo Caetano iniciou, embora não lhes tenha dado continuidade. De facto numa primeira fase o Presidente do Conselho procurou a descompressão política de três formas: ao aliviar a repressão poli­cial, ao aligeirar a atuação da instituição censura e ao possibilitar o regresso, como já vimos, de alguns exilados políticos. Esta fase ficou conhecida na História de Portugal como «Primavera Marcelista».
As expectativas de reforma que muitos portugueses esperavam ver colocadas em prática por Marcelo Caetano, rapida­mente, revelaram-se infundadas. O regime deste novo chefe do Governo procurou de facto dar ao povo ares de mudança, mas servindo-se de «roupagens» novas para situações que já eram velhas.
Em vez de proceder à extinção da odiosa e repressiva polícia política, o Presidente do Conselho, Marcelo Caetano, limitou-se a alterar-lhe a desig­nação. A PIDE passou então a chamar-se Direção-Geral de Segurança (DGS). Esta ação de «cosmética» foi também apli­cada a outras instituições existentes em Portugal. A União Nacional, partido único criado por António de Oliveira Salazar, nos anos 30, passou a designar-se Ação Nacional Popular (ANP) e procedeu-se à extinção da Censura que deu lugar ao Exame Prévio. Mudavam-se os nomes mas as funções mantinham-se intactas...
Rapidamente, a «Primavera Marcelista» mostrou a sua preferência pela continui­dade...
A manifestação de estudantes de 1969, que terminou com a greve aca­démica de Coimbra, foi recebida pelo Governo com repressão policial e a prisão de alguns estudantes como por exemplo Alberto Martins presidente da Associação Académica (1). Uma outra medida foi o encerramento temporário da Universidade a mando de José Hermano Saraiva, Ministro da Educação Nacional. A campanha eleitoral deste ano, ocorreu também de forma anómala, ou seja, com irregulari­dades. As eleições realizaram-se sem um controlo eficaz da oposição, tendo obtido a vitória exclusiva as listas do partido do Governo ou seja apenas os deputados propostos por Marcelo Caetano foram eleitos.
Pode afirmar-se que no que diz respeito às eleições legislativas de 1969, a única concessão do Presidente do Con­selho foi a permissão de inclusão nas lis­tas da Ação Nacional Popular (ANP), de um grupo de jovens deputados de tendên­cia reformista, que veio a designar-se Ala Liberal da Assembleia. Como exemplo de alguns deputados, que integravam esta tendência reformista, temos Pinto Leite, Francisco Sá Carneiro, Pinto Balsemão, Magalhães Mota e Miller Guerra. Estes jo­vens tentaram mediante a sua atuação a nível político e cívico conduzir à liberaliza­ção do regime. Defendiam, acerrimamente, a autonomia progressiva dos territórios co­loniais e uma abertura política. Goradas as suas expectativas em conseguir proceder à introdução de alterações no campo das liberdades, direitos e garantias optaram por abandonar a Assembleia Nacional. Conjuntamente com católicos progressis­tas, socialistas e republicanos conduziram à criação da Sociedade de Estudos para o Desenvolvimento Económico e Social (SEDES). Foi também fundado um novo semanário intitulado Expresso, dirigido por Pinto Balsemão. O Expresso foi sem sombra de dúvida um valioso instrumento de denúncia da ausência de liberdades cívicas que predominava em Portugal.
No ano de 1972, a reeleição de Améri­co Tomás, pelo colégio eleitoral, para um novo mandato como Presidente da República era mais uma confirmação de que não existia liberalização mas sim uma política de continuidade. Foi nesta conjun­tura que de 30 de dezembro de 1973 a 1 de janeiro de 1974 um grupo de individu­alidades, que se opunham à guerra colo­nial, entre as quais se destacam inúmeros católicos progressistas, como por exemplo Nuno Teotónio Pereira, Luís Moita e Fran­cisco Pereira de Moura, tomaram a de­cisão de ocuparem a Capela do Rato, em Lisboa, com a finalidade de procederem à comemoração do Dia Mundial da Paz. Tratou-se de «uma ocupação do templo acompanhada de greve de fome por parte dos presentes e de várias intervenções contra a Guerra Colonial» (2). Durante a vigília, que apresentava como temática «A paz é possível», com a duração de 48 horas, demonstrou-se mais uma vez que o regime político português não permitia a liberdade de expressão. A Direção-Geral de Segurança (DGS) reprimiu as vozes que condenavam a guerra colonial ao invadir a capela, que acabou, poste­riormente, por ser fechada, e proceder à prisão de vários manifestantes, como por exemplo do professor Pereira de Moura que veio a ser demitido da função pública.
Em 1973, realizou-se o III Congresso da Oposição Democrática. Esta foi mais uma oportunidade para proceder à união dos "grupos" que se opunham ao Estado Novo e preparar uma coligação com vista à participação nas eleições legislativas deste ano. Foram apresentadas quase 200 teses, sendo muitas delas em colec­tivo. As temáticas abordadas foram o trabalho, a juventude, a mulher, as liber­dades democráticas, o ensino, a cultura e a guerra colonial. Apesar de ter sido, ex­tremamente, difícil proceder à divulgação, propaganda, preparação e organização do congresso, este contou com a presença de setores importantes da sociedade por­tuguesa, conseguindo reunir um extenso número de militantes antifascistas oriundos de diversos quadrantes políticos. Porém, a intimidação do regime ditatorial português e a consciência da impossibilidade de se conseguir um processo eleitoral sem a existência de fraudes conduziram à desistência da candidatura, em listas conjuntas, do Partido Socialista e do Parti­do Comunista.
Apesar de algumas reformas levadas a cabo por Marcelo Caetano este não cumpriu a promessa de renovação e apostou na continuidade... Rapidamente, as franjas oposicionistas ao regime fascis­ta adquiriram consciência de que a sua es­perança numa democratização do regime havia sido uma pura ilusão. O desconten­tamento para com a política marcelista conduziu à luta nos campos, nas fábricas, nas universidades, nos meios intelectuais e nas Forças Armadas. Foram organiza­das ações violentas como assaltos a bancos e atentados bombistas por parte de formações partidárias clandestinas. O regime ia desta forma agudizando... 

(1) «Inicia-se uma duríssima e prolongada greve estudantil, após a visita de Américo Tomás, confrontado com os protestos e reivin­dicações académicas, que se saldará em vio­lentos confrontos com a PSP e a GNR, que ocupam a cidade, e rigorosas punições disci­plinares». História de Portugal, dir. José Mat­toso, Lisboa, Círculo de Leitores, 1994, p. 551.
(2) Ibidem, p. 552.